Um grupo pequeno mas nitidamente feio havia se formado na escuridão da rua da minha casa. Eu podia vê-los da janela do andar de cima, reunidos no espaço sombrio entre os postes parcamente espaçados. Eles estavam murmurando entre si. Secretamente.
Na época, Tottenham ainda era uma área não muito segura. Croydon estava em chamas, e Birmingham estava fervendo. Hammersmith poderia facilmente ser a próxima, e não adiantava reclamar disso no dia seguinte ou organizar um grupo de pessoas com vassouras para varrer os cacos de vidro numa demonstração de força cívica. Chega um momento na sua vida, etc, etc.
Essa hora havia chegado - ser o herói anônimo. Posso aparecer na primeira página do The Sun, ou ter uma escola batizada em minha memória.
Eu saí de casa. Eram meus vizinhos, discutindo sobre como defender a nossa rua, após rumores que a multidão estava a caminho. Eles (os vizinhos) não eram muito assustadores. Muitos são aposentados, um é arquiteto, outro é um artista, e outro é dono de um teatro. Eles estavam, até agora, desarmados.
"Eu tenho vários utensílios de jardim", disse um deles. Bom, claro que ele teria. "Eu tenho um ancinho", disse outro. Logo, todos estavam aparecendo com armas caseiras - pedaços de madeira, pedras, mangueiras de jardim. Estas pessoas, que eu normalmente cumprimento alegremente enquanto cuidam das ervas daninhas ou quando vão à loja da esquina para comprar o jornal, estavam armados até os dentes.
Eu ofereci os serviços de uma chave de fenda gigante. Com a data 1941 na lâmina, ela foi fabricada originalmente para o Real Corpo Blindado, para uso em reparos de tanques, mas ela também podia ser usada, em condições extremas, como uma baioneta. Quando mencionei isto, veio um silêncio um tanto gélido, a opinião silenciosa coletiva era que eu tinha ido um pouco longe demais.
Mas ainda tinha uma brecha enorme na nossa versão da Linha Maginot, equivalente àquela brecha gigante na linha original por onde o exército alemão passou, conhecida como Bélgica. O fim da rua parecia uma brecha nos muros de uma fortaleza, por onde as hordas poderiam penetrar, querendo estuprar e saquear. Talvez não estuprar, para ser honesto, mas alguns de nós tinha adornos bonitos.
A solução óbvia era usar um carro como bloqueio. Não é uma rua muito larga, e o melhor carro para a situação era, sem dúvida, meu Fiat Panda. Ele tem um diâmetro de giro muito bom, afinal de contas, e se ele fosse queimado, eu tinha outro carro na garagem.
Eu estava contente com esta idéia. Eu adoro o Panda, mas se você ama algo, você deve libertá-lo, ou talvez deixar que outra pessoa toque fogo nele. Isso mostraria a eles. Nada diz "chega!" como um hatchback 1.2 litro econômico e mal-estacionado, especialmente se não for a versão mais básica, e sim a que vem com rodas de liga-leve e ar-condicionado.
Sendo no fundo um liberal - o do tipo ingênuo, obviamente - eu prefiro tentar compreender os motivos sociais destes distúrbios e como poderíamos reexaminar as massas de pessoas insatisfeitas no nosso meio, mas ao mesmo tempo, se saqueadores ameaçadores entrarem na nossa rua, eu acho que devemos matar os desgraçados. Eles não vão gostar de serem acertados pela enxada do arquiteto, isso eu garanto.
E um Fiat pequeno não poderia morrer de maneira melhor. O Panda, em todas as suas encarnações, é conhecido como o veículo de pastores italianos e de estudantes britânicos de literatura inglesa, o 2CV do mundo moderno - básico, ligeiramente ridículo e, mesmo assim, resistente. Chique mas completamente fora de moda, um provérbio para um tipo de utilitarianismo que questiona todos os nossos outros conceitos de posse. É o carro que a mãe do amigo de alguém sempre teve. Era a escolha óbvia, em amarelo desbotado, para os batalhadores professores do filme Simplesmente Feliz. Mas o Panda nunca foi heróico. Até agora.
A imagem do meu Panda, espalhada pela mídia mundial, o tornaria um símbolo da resistência cívica, a versão de metal daquele chinês que ficou na frente do tanque na Praça da Paz Celestial. Nós faríamos para o Panda o que 007 Contra Goldfinger fez para o Aston Martin DB5. Nós daríamos a ele uma fama que o tempo jamais poderia diminuir. A partir de agora, as pessoas que dirigiam Pandas seriam pessoas que sabiam o que realmente importava no mundo.
E então, nos preparamos para nossa produção de Os Miseráveis, mas com o enredo adequadamente atualizado e urbanizado. Os fascínoras, sem medo, subindo na pequena barricada italiana, mas com cuidado, porque acho que tem um alarme, e seria irritante se ele disparasse. Quem ousaria aproximar-se dele, com os cabos das elegantes ferramentas para a administração do lar de classe média fazendo como se ele estivesse com os pêlos ouriçados? Podem vir, vagabundos! Podem vir com tudo para cima da gente! E do meu carro.
Eles nunca vieram.
Fonte: Top Gear Magazine (Novembro/2011)
Tradução: John Flaherty
Toda Terça-Feira, traremos artigos escritos por James May, falando sobre vários tópicos, quase todos sobre carros. Fiquem ligados.
LOOOOOOOOOOOL first
ResponderExcluirValeu a tentativa James!
ResponderExcluirmuito bom o texto e como de costume, não pra ser chato, mas para ajudar o blog eu tenho uma correção a fazer: no 11° parágrafo, o penúltimo.Está escrito digiriam, faltando o RI, para ficar DIRIGIRIAM.
ResponderExcluirO texto está muito bom, gostei, continuem assim pois estão fazendo um ótimo trabalho!
Galera,
ResponderExcluirEu achei a o DVD do Hammond para download com o James, só falta a legenda. A equipe do Topgearbr vai legendar o DVD?